terça-feira, 31 de maio de 2011

- toda cheia de estrelinhas. - ele fechou a porta e eu estranhei, não era comum. talvez hoje eu parecesse mais normal que o habitual.
começou a ler aquela folha de papel ofício com caneta azul, carimbo, caneta preta, carimbo. a maior parte da minha vida resumida em alguns parágrafos e nomes como escitalopram e carbonato de lítio logo abaixo.
- como você está se sentindo?
contei da melhoria nas últimas semanas, mas também da depressão que foi forte e persistente. contei da oscilação rápida, da euforia que (lamentavelmente) durou poucos dias.
ele me perguntou do sono, dos efeitos colaterais, explicou algumas coisas. tirou um remédio, aumentou a dose dos outros dois. marcou retorno para daqui a 15 dias.
- até ajustarmos os remédios precisamos desse contato mais freqüente, depois fica mais espaçado. os remédios têm que trabalhar à nosso favor. quando aparecer uma crise aumentamos a dose, quando a crise for, voltamos pro normal. você tem que se informar muito, ler sobre o assunto, aprender os termos, os sintomas, as suas reações particulares. é importante que você reconheça o que está acontecendo para o tratamento fluir bem. você tem que aprender a lidar com isso porque vai enfrentar por toda a vida.
toda a vida. é. eu sei.

tudo é muito mais leve quando o mundo não está em escalas de cinza. a consulta foi muito boa, o médico foi receptivo e atencioso, eu saí de lá com todas as dúvidas esclarecidas e confiante no meu tratamento. "por toda a vida" não me soou triste, pelo contrário, fiquei feliz com a certeza de nunca cair na estabilidade comum à todos, essa aí que eu nunca experimentei e não tenho a mínima curiosidade de experimentar.
tomei um sorvete e fui colocar um piercing no nariz.
de repente eu tenho 16 anos e todos os sonhos do mundo.

amor, amorzinho


eu ia escrever um texto reclamão, cheio de indiretas e com um final bem desesperançoso. mas aí eu olhei pro lado e:




eu não preciso disso.
boa noite pra vocês também.

sábado, 28 de maio de 2011

você é meu e eu não aceito nada contrário à isso. que se dane a pose de mulher-equilibrada-e-segura-de-si. que se dane a exigência diária de ter um relacionamento baseado em estabilidade. se eu não sou assim, quero convencer a quem que posso amar desse jeito?
não, não posso. meu jeito de te amar é forte e tem esse quê de destrutivo. posso soar meio louca querendo te estapear no meio de uma discussão banal só porque você ri pretensioso (você não devia fazer isso, definitivamente), posso parecer completamente descontrolada ao ignorar todas as coisas bonitas que construímos só por um deslize que você comete. eu sei, eu sei perfeitamente que tudo isso não parece nada racional. mas que se dane. não quero parecer mais nada. não me importam mais as aparências. não preenchem, não sustentam.
não me serve nada menos que plenitude. que paixão exalando por todos os meus poros, ainda que isso custe ciúme transbordando os copos, embebedando as noites.
não posso prometer ser previsível ou compreensiva. só posso prometer os beijos mais famintos e os olhos mais atentos.
não posso ser comum. não posso pintar as nossas flores de 'amor-perfeito'. têm sido damas-da-noite, que amam muito e logo secam.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

nome próprio




ainda tô meio engasgada depois de assistir esse filme. é muito carregado de drama, a câmera parece guiada por uma pessoa que não entende nada de filmagem até que você vê que detalha exatamente o que precisa, mesmo quando dá voltas ou fica torta. as palavras sendo escritas (literalmente) na tela e virando enredo da história. a atuação da Leandra Leal é tão incrível que dispensa qualquer comentário.
é o clichê urbanóide atual. que povoa toda a minha vida. to-da.
a solidão da Camila é a minha solidão. o transferir pro 'papel' as desgraças e os amores. a paixão pela escrita, a exposição, a intensidade, a depressão, os surtos. o excesso.
a cena em que ela começa a lavar a cozinha me fez ficar em posição fetal recordando as mil vezes que agi da mesma forma. as vezes que ela se perde nos braços das paixões inventadas... e quando ela acredita que é real 'os livros também acabam.'
ainda tô engasgada. assistam.

assim, bem assim

(clica na imagem)

quinta-feira, 26 de maio de 2011

pra te aprender

você vive me apresentando coisas novas, e a maior parte delas é sobre mim mesma. a primeira descoberta acabou se tornando uma dívida: se eu fosse uma música, seria um samba. merecia um e você o faria. ainda estou no aguardo.
soube também que tenho lindas maçãs do rosto (maçãs do rosto, veja só você, quem é que repara nessas coisas?). e que eu seria capaz de abandonar o "antes" para viver de "agora" e "depois". descobri que aquele sentimento egocêntrico e castrador - que jurei não fazer mais parte de mim - ainda pode me tomar inteirinha algumas vezes. e que eu, a rainha do drama (e da briga, sejamos bem sinceros) sou capaz de relevar muita coisinha e coisona se for pra que nosso aconchego nos braços um do outro aconteça.
ah, coisinhas... as minuciosidades, os detalhes... coleciono todos! frases, palavras soltas, risadas, opiniões, reações, carinhos, cheiros, sons, lembranças. minha memória - tão castigada, tão acabada - virou uma caixinha enfeitada com flores e laço de fita, recheada de cores e luzes e alguns borrões. quem se importa? num todo é tudo muito lindo.
você me mostrou também como abandonar velhos vícios. o da indiferença, por exemplo, não preciso mais cultivar. cerco-te de amor por todos os lados. e o principal, o vício da fuga, esse foi embora: fugiu! por você hoje eu sou entrega, sou paixão, pele, delírio, convicção. só me escondo no seu colo e é do resto do mundo, porque esse sim atormenta e me faz espernear. você não, você me acalma, me nina, me conduz pra uma realidade que não é essa doentia que vejo nos noticiários e no cotidiano que somos obrigados a seguir. é um mundo com cores, sons, sensações, luzes e, tudo bem, tem também os borrões... mas lindo, muito, muito lindo. e nosso.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

amores que não são da china

um amor que não venha pronto, mas não demore a se fazer inteiro. com o cheiro do outro impregnado na própria pele, com a lembrança do primeiro e do último beijo após cada 'tchau', com um 'nós' sem apertos, só entrelaços.
um amor dos que não foram vividos ainda, dos que só os românticos em essência vivem em sonhos e se frustram por não vivenciar no plano real. sem jogo de egos, sem guerrilhas de ciúmes. sem insegurança. sem grandes medos. que o maior medo seja escolher errado o sabor da gelatina ou atrasar um pouco para o encontro marcado pra logo mais.
amor que faz cócegas por dentro. que faz sorrir com os olhos. que faz suspirar ao longo do dia com lembranças puras ou não. que faz ter desejos incontroláveis. um amor que não censure nenhum tipo de desejo, de nenhuma espécie, com nenhuma finalidade.
um amor que se faça apaixonado todos os dias. que surpreenda de maneiras bonitas e quentes. que jamais - nunca, em tempo algum - assuste.
um amor que se faça presente em tempo integral. e que isso deixe de ser perturbador para ser reconfortante. que se possa sonhar junto, planejar junto, fazer junto. que nenhum sonho ouse parecer pequeno ou bobo aos olhos do outro.
que o aprendizado seja constante e os dois guiem-se mutuamente por ele. que os tropeços não passem de motivos para rirem juntos. que o medo da queda seja muito pequeno comparado à certeza da conquista.
um amor que dê certezas. sim, certezas, chão, coisas concretas, sólidas e palpáveis. porque de efêmera, breve e incerta já basta a vida.

sábado, 21 de maio de 2011

Gabito Nunes

"Num instante você me olha apaixonado e depois se vira pra janela ficando um pouco fora do ar. Nessa hora me belisco pra não saber do porquê, sem esquecer do dia você me falou que nem toda pergunta requer uma resposta. Mas então não fica assim, não precisa dizer nada, só não me deixe faltar aqueles abraços silenciosos pra calar a boca de quem me mandou ter calma contigo. Agora que eu me perdi, só preciso de você me dizendo que amanhã ainda vou te achar no mesmo lugar, se eu procurar. Eu te quero, na medida do impossível.

Pega no meu queixo e diz que não sou só eu que sinto medo aqui. Faça alguma coisa ruim, qualquer coisa que me impeça imediatamente de sentir esse amor absurdo por você. Estou nas suas mãos e isso não é uma metáfora. Porque eu já não sei mais nada. Parece que sou mesmo seu foco de vida, mas também pode ser que você ande apenas distraído do resto do mundo. Ou, vai que você tá mesmo certo, as coisas são assim mesmo, o amor invade pela boca enquanto a gente se olha e fica rindo."

sexta-feira, 20 de maio de 2011

"não faço mestrado,
 mas meu brigadeiro é 
ótimo."

a banda mais bonita da cidade






porque eu estou completamente apaixonada.

sabe quando tudo vai mal e, de repente, as coisas vão se iluminando?
pouco a pouco, sem pressa, sem os costumeiros exageros.
só luz. e pureza.


(essa é a última oração pra salvar seu coração)

terça-feira, 17 de maio de 2011

Eu amo tudo o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé,
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi, e voou
E hoje já é outro dia.


Fernando Pessoa.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

- mas todo mundo tem seus momentos bons e ruins, todo mundo fica "pra baixo" e sem vontade de fazer as coisas, você precisa ser mais forte e lutar mais pelo o que quer...
sabe o que eu quero mesmo? eu quero que vocês vão todos tomar no seus cus.
vocês não têm a mínima idéia do que estão falando e menos ainda do que eu sinto e passo a minha vida inteira. e eu não quero a dó, o esforço, as fofoquinhas, os incentivos falsos, eu não quero porra nenhuma de vocês.
só tomem no cu e me deixem em paz.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

está tudo planejado:
se amanhã o dia for cinzento,
se houver chuva
se houver vento,
ou se eu estiver cansado
dessa antiga melancolia
cinza fria
sobre as coisas
conhecidas pela casa
a mesa posta
e gasta
está tudo planejado
apago as luzes, no escuro
e abro o gás
de-fi-ni-ti-va-men-te
ou então
visto minhas calças vermelhas
e procuro uma festa
onde possa dançar rock
até cair

terça-feira, 10 de maio de 2011

libidinosa

quando morava com meus pais meus horários eram muito restritos. eles sempre foram mais rigorosos comigo do que com meus irmãos, e mesmo depois de quase três anos morando separados da filha problemática, ainda são.
foi em uma dessas noites em que eu tinha que voltar antes das dez horas da noite que a Vanessa apareceu no meu portão. minha mãe não gostava dela, já tinha percebido que era uma das minhas amigas lésbicas. não sei que já tinha percebido é que dávamos uns amassos sempre que nos víamos.
tínhamos menos de 18 anos e muito pouco juízo, como já era de se esperar.
Vanessa me chamou para uma reuniãozinha na casa da Gislaine, uma amiga do colégio. pra beber um pouco e conversar. eu sabia a real intenção por trás daquilo e aceitei. inventei uma desculpa qualquer pra minha mãe e fui com ela.
já no meio do caminho nos agarramos como sabia que ia acontecer. chegando lá vi que só tinha cerveja, que é a única bebida que eu não tomo. e maconha, que eu não uso. tinha um amigo gay delas, o Fernando, e ele já estava muito alterado. normalmente eu acharia aquilo horrível e ia de volta correndo pra casa, mas naquele dia eu achava tudo muito divertido.
levei Vanessa pro quarto da Gislaine e fizemos tudo o que estávamos acostumadas a fazer.
depois o Fernando, muito mais chapado do que já estava, chegou andando de salto alto e falando coisas sem sentido. eu era a única sem usar droga ou álcool, e era a que mais me divertia, falava coisas engraçadas, ria de tudo. eles pediam para ver meu sutiã e eu mostrava, me exibindo, deixando que eles pegassem onde quisessem.
- me dá um beijo? a Alice era tão apaixonada por você e vivia falando desse beijo gostoso, quero saber como é. - me pediu o Fernando. Alice era uma ex-namorada que fez parte da minha vida de um jeito muito bonito. o comentário só me causou mais euforia, alimentou meu ego, aumentou minha libido já exagerada. e então eu o agarrei e beijei com voracidade. ele era gay e aquilo não fazia o menor sentido.

em outro episódio Gislaine e eu já havíamos ficado juntas, no banheiro de um shopping, durante uma parada gay. eu namorava com Alice e ela me esperava do lado de fora do banheiro. também não tinha bebido nada, e era completamente apaixonada pela minha ex-namorada.

e sobre namoros apaixonados houve o Pedro que foi a maior perda da minha vida. ele apareceu em meio ao meu caos. e, como não poderia deixar de ser, foi consumido por ele.
em uma das noites em que eu o arrastava para meus programas malucos, estávamos bebendo com um grupo de gays e minha amiga Jenifer. de lá decidimos ir todos para a casa do Rodrigo, um dos amigos gays da turma. compramos mais bebidas e fomos. um dos caras, o Junior, era muito lindo e Jenifer e eu brincávamos de seduzí-lo, óbvio, sem sucesso. ele nunca havia ficado com mulher na vida inteira.
chegando na casa do Rodrigo já estávamos todos bêbados. Jenifer se atracou com um dos meninos que era na verdade bissexual. e eu já tinha um quarto reservado pra mais tarde com o Pedro. Rodrigo era muito parceiro quando o assunto era sexo.
em algum momento Junior e Jenifer me chamaram para ir ao banheiro fazer xixi. essas coisas que meninas e gays fazem juntos. enquanto ele fazia xixi sentado, Jenifer e eu nos provocávamos.
- se vocês se beijarem eu beijo vocês. - ele sabia que estávamos mesmo afim de beijá-lo. - nunca vi duas mulheres tão bonitas assim se beijando.
não precisou pedir duas vezes, claro. nos agarramos e ele soltou gritinhos histéricos. até que de repente senti uma encoxada e uma pegada tão certeira que eu jamais diria que ele nunca tinha tocado o corpo de uma mulher antes.
descíamos para a sala e ficávamos com nossos respectivos pares, e toda hora estávamos os três nos atracando no banheiro novamente. quando começaram a desconfiar de alguma coisa, fingimos que o Junior estava passando mal e estávamos cuidando dele.
terminei a noite no quarto com o Pedro.


não sei se sou o tipo de pessoa que pode ser considerada promíscua. hoje sei exatamente o que me levou a fazer essas coisas e tantas outras, o que deixava a minha libido descontrolada, meu senso crítico sem nenhuma noção e minha impulsividade comandando tudo no meu corpo.
provavelmente todo mundo que ler isso vai me olhar diferente. e não é nem o começo do que aconteceu na minha vida sexual convivendo com a hipomania e seus exageros.
o que eu quero dizer com tudo isso é que perder o controle não só é pular de um penhasco ou tomar uma dose fatal de veneno, não é só ir parar numa enfermaria de hospital psiquiátrico e tomar sedativos ou choques. perder o controle é despersonalizar-se, deixar que qualquer coisa que é só uma parte de você passe a ser o seu todo e te faça tomar decisões impensadas que mudam todo o curso da sua vida.
eu não me viciei em drogas, não peguei nenhuma DST e nem engravidei. por sorte, por Deus, por um piscar de olhos, talvez. mas perdi tantas coisas que são imensuráveis, incalculáveis... e imperdoáveis.


(...)
Eu adoro todas as coisas
E o meu coração é um albergue aberto toda a noite.
Tenho pela vida um interesse ávido
Que busca compreendê-la sentindo-a muito.
Amo tudo, animo tudo, empresto humanidade a tudo,
Aos homens e às pedras, às almas e às máquinas,
Para aumentar com isso a minha personalidade.

Pertenço a tudo para pertencer cada vez mais a mim próprio
E a minha ambição era trazer o universo ao colo
Como uma criança a quem a ama beija.
Eu amo todas as coisas, umas mais do que as outras,
Não nenhuma mais do que outra, mas sempre mais as que estou vendo
Do que as que vi ou verei.
Nada para mim é tão belo como o movimento e as sensações.
A vida é uma grande feira e tudo são barracas e saltimbancos.
Penso nisto, enterneço-me mas não sossego nunca.

Álvaro de Campos

quinta-feira, 5 de maio de 2011

é só saudade


da nossa cumplicidade. dos olhares que desvendavam e não desses que parecem perfurar.
dos silêncios que confortavam e não desses incômodos que precisam ser preenchidos com qualquer assunto banal.
das nossas conversas despretensiosas que eram esquecidas no minuto seguinte, e não dessa mania que adquirimos de remoer cada palavrinha dita.
do futuro ser quase palpável.
de me sentir completa mesmo sem estar fisicamente ao seu lado.
de me sentir completa e absurdamente feliz quando no seu abraço.
de não existir dúvida quando nossos peitos estavam próximos.
é só saudade... e dói tanto...











(e saudade não é amor. continuo cansada.)



quarta-feira, 4 de maio de 2011

EUSpelho - Curta para o Festival Curta a Vida 2009




a morte às vezes é mais desejo que medo.
a noite, tortura sem fim. espinhos entre o 'não' e o 'sim'.
me resta a dor, a fé e o suor.
espero as férias, a cura.
pra mim a esperança não ressuscitou no terceiro dia.
e minha maior dúvida é que, se eu conseguir dormir,
quando eu acordar em que pólo vou estar?



segunda-feira, 2 de maio de 2011

eu não quero mais falar de amor.







(não é revolta, não. é só cansaço)

domingo, 1 de maio de 2011

nostalgia

algumas vezes eu ando por aí com fones de ouvido que não tocam música alguma. só quero me ausentar do barulho que o mundo faz - é demais pra mim. a razão de não ouvir nenhuma canção é por não querer sentir o que elas trazem consigo. cada uma delas têm seu peso, suas dores, suas alegrias, suas lágrimas, suas esperanças, seus jardins.
prefiro o silêncio.
foi então que hoje as músicas foram tocando aleatoriamente enquanto eu conversava com pessoas queridas. algumas mexeram tanto comigo que não consegui fugir. e quando tocou uma em especial (e não, eu não preciso dizer qual é, ela jamais terá para ninguém o som que tem pra mim) as lágrimas saíram de tão profundamente que doeram. e eu também sorri.
que saibamos o momento de sentir saudade. s-a-u-d-a-d-e. do primeiro namorado que dava presentes que mandava a irmã escolher, por tanto medo de errar. dos amigos que sentavam na calçada pra tocar violão e rir noite a dentro. das viagens impensadas e incríveis. do conviver diário com o crescimento dos irmãos. do animal de estimação que deu e recebeu mais amor que qualquer outra pessoa que passou pela sua vida. do carinho excessivo de um pai com muito amor e muita falta de jeito. do amor destrambelhado de uma mãe tão perdida quanto você. da primeira mudança capilar radical e a ansiedade pela aprovação alheia. de ter tantas certezas e tão poucas ameaças reais. dos castelos de areia parecerem mais sólidos. da professora que não te ensinou a matéria do colégio, mas te salvou de alguma (ou qualquer) maneira. de avós lindos, lindos. de primos com tanta vida nos olhos e tanto chão pela frente. de recostar-se no peito de quem amava e ter certeza que nenhum mal poderia te atingir - nem longe dali. de ter certeza que o amor (e talvez só amor) salva. de crer em deus e em todas as maravilhas que ouviu dizer que ele é capaz. de acreditar que ainda tem uma vida toda pela frente.
e que saibamos, principalmente, deixar a saudade ir embora... com tudo o que ela traz.

inquietude

minha irmã bordava e eu acompanhava com os olhos. inquietos, como minhas mãos. gesticulavam muito enquanto eu contava um caso atrás do outro, assuntos mil sem nunca ter fim.
eu precisava de repouso. sabia disso tão bem quanto também sabia que não conseguiria tê-lo. os pensamentos são velozes demais, não se aquietam, não dão sossego.
pensava em bordar, mas se caso não conseguisse colocar a linha na agulha de primeira tentativa, certamente enfiaria a agulha no dedo, a quebraria ou gritaria mil palavrões como se pudesse ofendê-la. perdia a razão, logo eu, veja só, a pessoa que mais se obriga a ser racional que já conheci em toda minha vida.
era capaz que eu acreditasse que minha agulha se entortou de propósito, só pra que eu não conseguisse fazer o que havia planejado para aquela tarde. que ela queria me envergonhar, me fazer passar por tapada na frente da minha irmã. e então eu ficaria ainda mais irada com a pobre e não restaria nem um pedacinho pra contar história na caixinha dos bordados.

quando meu irmão namorava a Magá (que hoje é das minhas melhores amigas) costumávamos passar o domingo juntos, toda a família reunida na casa da minha mãe. almoçávamos, comíamos alguma sobremesa deliciosa que a cunhada preparava e depois conversávamos e ríamos o resto do dia deitados na cama grande e espaçosa.
algumas vezes eu não me calava, não deixava mais ninguém falar. perdia a noção completamente. emendava um assunto no outro e geralmente eles não tinham ligação nenhuma. freud, dificuldade de aprendizado, psicopatas, os erros do meu pai, as coisas que meus irmãos e eu aprontávamos quando mais novos, medos, planos futuros, o assunto do momento na televisão... uma coisa logo se encaixava na outra e não tinha espaço pra mais ninguém opinar.
"era cansativo", a Magá me disse uma vez, "eu ficava pensando o que estava acontecendo com você, se era possível que ninguém reparava que algo estava errado, não era normal alguém ficar daquele jeito, você não conseguia desligar, não parava de falar e se movimentar, tinha idéias malucas e ninguém conseguia acompanhar seu raciocínio. eu achava que era uma depressão diferente. sabia que tinha algo errado ali".

não gosto de gritos. minha educação foi feita na base da conversa (sim, podem acreditar).
a Mel insistiu três vezes que eu estava com fome, agorinha a pouco.
CA-RA-LHO, ME DEIXA EM PAZ, QUER SABER ATÉ A HORA QUE EU TÔ COM FOME? VAI TOMAR NO CU. foi assim que eu respondi.




ando raivosa. inquieta. geniosa, teimosa. agitada. im-pul-si-va.
estou perdendo a razão novamente e acredito que seja só um efeito colateral.
o problema todo é que eu não quero parar. é melhor assim. tudo muito intenso... muito eu, muito meu. só meu.